CAPÍTULO 1
VISÃO HISTÓRICA E COMPARATIVA DO
ENSINO DA LEITURA E DA ESCRITA
O ensino da leitura e
da escrita no Brasil passou por diversas modificações e influências oriundos da
psicologia e da linguística. Será descrito um breve histórico sobre os métodos
e processos de alfabetização, até chegarmos ao atual conceito sobre
alfabetização.
1.1 Os critérios de classificação de
métodos
Os métodos mais
difundidos eram divididos em dois grupos: no primeiro, a metodologia leva o
aluno a combinar elementos isolados da língua, sons, letras, sílabas, em todos
maiores palavras e frases, tendo como base o processo mental de síntese. No
segundo grupo estão aqueles que levam o aluno a destacar unidades linguísticas
maiores, palavra ou frase e decodificá-las em elementos menores, tendo como
base o processo mental de análise.
1.2 Métodos que Dão Ênfase ao
Processo Mental de Síntese
·
Método alfabético
Deu origem ao termo
alfabetizar tornou-se universalmente aceito e foi empregado desde os tempos da
Grécia e Roma antigas até o fim da idade média. Ainda persistiu em alguns
países, no século XIX, com maior ou menor duração.
Sua familiaridade de formas com nomes de letras ajudava o aluno,
através da repetição de sons reconhecidos nas letras, a soletrar as palavras,
como por exemplo: gê com a = gá, tê com o = tó, mesmo sem identificar seu
significado.
No inglês era conhecido como
“spelling-method”. Na América do Norte foi longamente difundida durante todo um
século (1783-1890), através de seus 80 milhões de exemplares. Nos Estados
Unidos foi um fator indiscutível de difusão do método durante um largo período
de tempo. (RIZZO, 1989, p.5).
·
Método Fônico
Passou a ser adotado em
lugar do alfabético na tentativa de superar a grande dificuldade existente
naquele, por causa da diferença entre o nome e o som da letra.
Os sons das letras são
ensinados isoladamente e depois em sílabas que são pronunciadas pelos alunos.
Então são reunidas e apresentadas em conjuntos maiores formando as palavras.
Estas depois aparecem formando pequenas frases.
O método é mais
eficiente quando a língua tem formas (letras) e sons, invariavelmente,
correspondentes.
É por princípio, um
método eminentemente lógico. Primeiramente, são ensinados os sons das vogais,
fazendo-se de forma simultânea, o ensino da forma da letra e a maneira correta
de pronunciá-la. O método insiste numa forte repetição até que esta associação
se estabeleça por completo e o aluno a pronuncie automaticamente.
Depois das vogais, as
consoantes são introduzidas numa determinada ordem pré-estabelecida e seus sons
são combinados com as vogais.
Depois de o treinamento
atingir o pronto reconhecimento de combinações com vogais com três ou quatro
diferentes consoantes, as sílabas são introduzidas e logos combinadas formando
palavras. Mais tarde, combinações de palavras, com sons conhecidos, formam
frases, geralmente sem sentido.
Este procedimento ainda é largamente difundido em muitos países,
inclusive no Brasil, apesar da contraindicação a determinadas línguas, por ser
um método econômico e de fácil aplicação. (op.cit. p.8)
Exemplo
de um dos métodos fônicos muito usados
no Brasil: método da abelhinha
·
Método Silábico
Difere dos sintéticos
anteriores (alfabético e fônico) por ser a sílaba a unidade fonética
estabelecida para o ponto de partida do ensino da leitura.
Basearam-se os
introdutores deste método nos princípios linguísticos, de maior aceitação entre
os estudiosos da Fonética, de que como a consoante só pode ser emitida apoiada
na vogal só a sílaba e não as letras servem como unidade linguística para o
ensino da leitura.
Presta-se ao ensino das
línguas especialmente silábicas como o português, o espanhol e vários idiomas
africanos, mas especificamente, ao ensino do japonês, cuja estrutura é
essencialmente, silábica.
Uma característica
acentuada é a não permanência da palavra original (apoiada na gravura). Logo
que as sílabas são destacadas e passam a ser reunidas em novas combinações,
formando todos diferentes.
Em geral, no português
e espanhol, as vogais são apresentadas sozinhas e, depois combinadas entre si
(ai, oi, ei, au). Depois as consoantes são apresentadas na sua ordem
alfabética. Logo, iniciam-se os agrupamentos, utilizando-se a ilustração para
apoiar a sílaba destacada. A ordem de apresentação destes fonemas – atualmente
varia.
Muita ênfase é dada à pronúncia, em voz alta, das sílabas isoladas na
ordem natural do a-e-i-o-u. Ex: ba - be- -bi- bo – bu . Mantém-se o som aberto
característico do a-e-i-o-u em todas as combinações.
O
ensino é extremamente repetitivo e tenta manter uma ligação de cada sílaba a
uma palavra ilustrada.
Ex: ca ( de caneca)
be ( de bebê)
lo ( de lobo) ca-be-lo
A partir da primeira lição, aparecem pequenas palavras e sentenças para
serem lidas com as sílabas apreendidas. Mas ainda é muito frequente o
aparecimento das sentenças que, só se dão, efetivamente, após o treinamento de
leitura de palavras soltas.
Os
verbos necessários à formação das sentenças ficam restritos às possibilidades
oferecidas pelas sílabas destacadas, e por isso, nem sempre fazem sentido junto
às palavras que podem ser lidas. (op.cit, p.15)
Exemplo de atividades do método silábico:
1.3 Métodos que Dão Ênfase ao
Processo Mental de Análise
Este segundo grupo de
métodos baseia-se no conceito de que as unidades significativas da língua –
palavras, sentenças e historietas é que devem ser o ponto de partida.
Depois que estas
unidades, cada vez maiores, forem reconhecidas, é que as unidades menores
passam a ser reconhecidas isoladamente. Estes métodos são conhecidos também por
“Globais”, pois receberam a influência da psicologia de Gestalt, na qual, a
percepção se faz do todo para as partes (detalhes), tanto em ideias quanto em
formas.
Nestes métodos a
leitura é um processo de percepção de ideais e devem constar de elementos
ideativos, ou seja, lidar com unidades linguísticas significativas.
·
Palavração
A
palavração nasceu da revolta contra os métodos formais que prevaleceram nos
primeiros anos. Commenius é apontado como sendo o seu introdutor. Na sua obra
“Orbis Pictus”, publicada em 1657, ele já a defende contra as tediosas
soletrações, que nada mais são que métodos de tortura da mente. A seu favor,
grandes especialistas como: Jacob, Horace e Declory. (op.cit.p.23)
Neste método, as
palavras são apresentadas em agrupamentos (conjunto organizado por alguma
associação de idéias) e os alunos aprendem a reconhecê-los pelo método see and
say, visualização em português. Para os adeptos deste método, a palavra é memorizada
facilmente pelo aluno, sendo algo normal no indivíduo.
Muitos recursos são
utilizados para facilitar este reconhecimento. Geralmente, no início, as
figuras acompanham as palavras. A repetição do seu reconhecimento estabelece a
memorização.
A ordem de apresentação
das palavras, quando criteriosamente planejada, auxilia substancialmente, o
estabelecimento de habilidades de leitura inteligente. Ao mesmo tempo a atenção
é dirigida aos detalhes da palavra, como: sílabas, letras e sons. Estes reunidos
auxiliam o aluno a enfrentar novas palavras com autonomia na leitura.
O “Método Normal de Palavração” é uma adaptação no qual as palavras
memorizadas contêm todos os sons da língua e onde os processos de
análise-síntese são empregados simultaneamente, se o método de palavração não
tiver análise incluída no seu processo de ensino-aprendizagem, ele não é
considerado método analítico.
(op.cit. p.24)
·
Sentenciação
A sentenciação
representa um 3º estágio na evolução dos métodos que enfatizam a formação de
habilidades de leitura com compreensão.
Antes
dela, surgiu na língua inglesa o “Phrase – Method” que representava pequenos
grupos de palavras e levava o aluno a estabelecer o reconhecimento de cada um,
através da repetição. Alcançava o reconhecimento da palavra pela sua incidência
nas frases e o reconhecimento das sílabas, pela sua ocorrência em estruturas
similares. (op.cit.p.28)
Psicólogos estudiosos
dos movimentos dos olhos Andersen e Dearbon, no entanto, mostraram que as
pausas e fixações do olhar na leitura das linhas é um processo mental, que nada
tem a ver com a percepção visual das palavras e provaram que os leitores mais
eficientes não aprendem o texto lidos, frase por frase (como até então se defendia a ideia) e, sim,
por grupamentos, mais ou menos, regulares de palavras e letras, em cada linha.
Até hoje, não é
reconhecida a possível “lei” que determina esta seleção de palavras e letras
durante a leitura. De qualquer forma, comprovou-se não ser verdadeira a
hipótese de que os leitores fixassem grupos de palavras durante o ato de ler.
Logo, o fato em que se apoiavam os defensores da “Phrase-Method” foi derrubado
e sua validade tornou-se discutível. (ib.ibdem)
Além disso, por ser muito dispendioso, logo caiu em desuso.
O Phrase-Method antecedeu o Sentence Method. Faz necessário mencionar a
conotação diferente que esta palavra tem em inglês:
Phrase: group of words (often without a finite verb) forming part of
sentence; in red, at noon.
Com este sentido, este método nunca
chegou a ser empregado no Brasil. (op.cit.p.28)
O método dirige
primeiramente a atenção do aluno a algum assunto ou atividade do interesse da
classe. O tema é discutido e o segundo passo é fazer o registro de uma das
afirmações obtidas dos alunos, sobre o assunto ventilado. O professor lê, em
seguida, com entonação adequada (marcando bem as pausas a fim de tornar
bastante clara a expressão da ideia). Depois os alunos são orientados a
procurar palavras semelhantes dentro da sentença. E depois da 2º ou 3º lição,
começam a formar grupos de palavras semelhantes às primeiras. O processo
continua através de um treinamento para se obter o reconhecimento, à 1º vista,
das palavras estudadas. E finalmente, os alunos são levados, através de um
processo semelhante à análise comparativa, a isolar elementos conhecidos nas
palavras. Com este conhecimento passam a enfrentar leitura de palavras novas.
·
Método Historiado
“de historietas”
“de histórias”
“de contos”
No Brasil é também
frequentemente, chamado de método de Pré-livro, muito embora, esta nomenclatura
tenha sido criada por Heloisa Marinho para indicar material de ensino de
leitura, com características, inteiramente diferentes (leia-se Método Natural).
O método de “Contos”
representa uma extensão (e não adaptação) do método de sentenças e foi
organizado no sentido de ampliar as vantagens de desenvolvimento de hábitos e
atitudes excelentes na leitura.
Este método apresenta
sequência de sentenças organizadas em forma de história, atendendo aos
princípios de interesse e apelo (que ela representa) à criança. Isto foi
decorrente do resultado da avaliação do conteúdo (ideativo) das sentenças e os
interesses, atividades e experiências da vida infantil.
A história apresenta
uma série de eventos, com principio, meio e fim, e desde que atenda aos
interesses do aluno, torna-se fácil despertar a curiosidade na leitura do
material.
Este método, não é melhor que o anterior no sentido de desenvolver no
aluno a capacidade de compreensão, mas treina-o na habilidade de antecipar e
seguir uma sequência de ideias, e ainda, relacioná-las entre si, mantendo-as na
memória. Isto, evidentemente, implanta o gosto pela leitura e a busca pela boa
leitura. (op.cit.p.23)
Como a leitura da
história não pode ser feita totalmente, de uma só vez ela oferece oportunidade
e implanta hábitos de discussão sobre cada evento que se sucede na narrativa.
O processo segue depois
as mesmas técnicas da sentenciação.
·
Método Natural
Com o objetivo de reduzir ao máximo, ou evitar na sua totalidade, as
falhas comprovadas nas metodologias existentes, foi desenvolvido por Gilda Rizzo, a partir dos ensinamentos
teóricos da professora Heloísa Marinho, à
qual fez longos estudos na Alemanha (escola-estruturalista- Gestalt,
1936). (op.cit.p.37)
O método Natural
utiliza o próprio vocabulário da criança no processo de alfabetização, tornando
a aprendizagem significativa, pois prende o interesse da criança. Este método
também é realizado de forma interdisciplinar com as áreas de História,
Geografia, Ciências Naturais e Matemática. Amplia o conceito de alfabetização
além da decodificação do código escrito, para uma leitura e escrita contextualizada
de acordo com o tema de interesse da criança desenvolvido.
1.4 Conclusões Gerais do Estudo
Comparativo
Grupo 1
Dentro do grupo, as
adaptações do fônico se revelaram como sendo as mais capazes de desenvolver
habilidades de pronto reconhecimento da palavra nova. Porém, o processo
empregado para o desenvolvimento destas habilidades se mantém em franca
oposição ao desenvolvimento de habilidades de compreensão a ao natural processo
de aprendizagem.
Grupo 2
O historiado ou método
natural são os métodos que mais revelaram ser capazes de desenvolver a leitura
com compreensão, despertando o interesse pela leitura como fonte de prazer e
informação.
Hoje e no mundo
inteiro, tentam-se combinações dos vários processos, sendo muito raro encontrar
uma cartilha ou método puro.
No Brasil existe uma
forte permanência do emprego do silábico (influências histórico-culturais).
De um modo geral, as
cartilhas brasileiras apresentam as seguintes variações:
·
Na constituição do vocabulário.
·
Na sequência de apresentação das sílabas, sons
e letras.
·
No custo do material impresso.
·
Na quantidade e qualidade do material
de apoio.
Músicas do folclore brasileiro e cantigas populares demonstram a força
da penetração do método silábico no Brasil:
O a e i o u
Vamos todos aprender!
Soletrando o be- a –bá
Na cartilha do a b c
A – E – I – O – U
ba bé bi bó bu
Wu-u ,W-u
Na cartilha da Juju! (op.cit. p.36
CAPÍTULO 2
PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA, UM
MARCO NA HISTÓRIA DA ALFABETIZAÇÃO.
Será descrito um breve
histórico da carreira, vida pessoal e política da psicóloga Emília Ferreiro,
antes de descrever as transformações que o estudo psicogenético da escrita
produziu na alfabetização escolar.
Emília Ferreiro nasceu
na Argentina, mas vive atualmente no México, tendo nascido em 1937. Neste país,
trabalha no departamento de Investigações Educativas (DIE) do Centro de
Investigações do Instituto Politécnico Nacional do México. Fez seu doutorado na
Universidade de Genebra, no final dos anos 60, dentro da linha de pesquisa
inaugurada por Hermine Sinclair, que Piaget chamou de psicolinguística
genética.
Voltou, em 1971, a
Universidade de Buenos Aires, onde constituiu um grupo de pesquisa sobre
alfabetização do qual faziam parte Ana Teberosky, Alicia Lenzi, Suzana
Fernandez, Ana Maria Kaufman, Liliana Tolchinsky. Mas a situação política da
Argentina ia se deteriorando progressivamente, e no final de 1974 a Dra.
Ferreiro acabou afastada de suas funções docentes na universidade ,assim como
seu marido Rolando Garcia, Física e pesquisador com quem Piaget dividiu a
publicação dos seus últimos trabalhos. Foi para Genebra, onde ficou exilada,
enquanto Ana Teberosky, também exilada ficou em Barcelona. Os dados obtidos em
Buenos Aires foram estudados exaustivamente pelas duas pesquisadoras, através
de uma ponte entre Genebra e Barcelona.
Ferreiro voltou para a
América Latina no México e continuou a realizar vários trabalhos, publicando
vários livros em relação à alfabetização e o fracasso escolar neste ano de
escolaridade.
Em 1979, publica o
livro “Los Sistemas de escrita em El Desarrolo Del Ninõ” – que em português
recebeu o nome de “Psicogênese da Língua Escrita” – 1986.
O
estudo psicogenético da escrita deslocou o foco de investigação do como se
ensina para o como se aprende, portanto descreve estágios desenvolvimentais no
processo de leitura e escrita e não um método de alfabetização. No entanto, os
alfabetizadores atualmente estão reconhecendo que não são erros de escrita o
que as crianças apresentam no processo de alfabetização, mas sim que se
encontram em um determinado nível de hipótese sobre a escrita, portanto, estes
poderão intervir de forma que a criança crie um desequilíbrio na lógica do seu
pensamento , passando então para outro nível de escrita. As pesquisas de Emília
Ferreiro recolou no centro da aprendizagem o sujeito inteligente que Piaget
descreveu. (WEIZ, 2005, p.8)
As pesquisas dessa
psicóloga produziram uma revolução conceitual na alfabetização, desmontando
todas as explicações que havíamos construído ao longo de décadas para
justificar o estrondoso fracasso das crianças brasileiras na alfabetização
inicial.
Desde que dispomos de estatísticas
educacionais confiáveis - e lá se vão mais de 50 anos – temos dados que nas
escolas brasileiras são reprovadas metade das crianças na passagem da 1ª para a
2ª série. As tentativas de explicação falavam de problemas de aprendizagem que
se justificavam ora em função da carência nutricional, ora na falta de estímulo
intelectual, de carência cultural, de problemas psiconeurológicos ou então
deficiência linguística. Todos os problemas eram das crianças, mas não
enxergavam as deficiências da escola. Um dos discordantes era Paulo Freire, a
qual chamou a educação de bancária, na qual a criança armazena dados,
totalmente descontextualizados da realidade de vida desta.
Concluía-se que metade
das crianças era pouco capaz de aprender a ler e a escrever.
Existiam, e ainda são realizadas as chamadas atividades de prontidão,
na qual as crianças realizam vários exercícios motores, sem nenhuma letra
envolvida, ou quando estas existiam, era somente para cobri-las sem nenhuma
significação. A partir dessas avaliações a escola decidia se a criança
frequentaria uma escola regular ou iria para uma classe de educação especial.
(op.cit.p.8)
As investigações de
Emília Ferreiro e colaboradores demonstraram que, ao contrário do que se
pensava, a questão crucial da alfabetização inicial é de natureza conceitual e
não perceptual. Segundo Ferreiro:
A mão que escreve e o olho que lê estão sob o comando de um cérebro que
pensa sobre a escrita. Escrita essa que existe em seu meio social e com o qual
toma contato por atos que envolvem, de alguma forma, sua participação em
práticas sociais de leitura e escrita. (op.cit. p.9)
2.1 Proposições
Construtivistas e Tendências Equivocadas
da Transposição Pedagógica
·
Proposições Construtivistas
·
Evolução psicogenética
entendida como um processo ativo e pessoal de elaboração cognitiva, a partir
das experiências vividas.
·
Construção do
conhecimento a partir de condições favoráveis para o envolvimento pessoal, a
elaboração e testagem de hipóteses, a possibilidade de descoberta e a
apropriação do saber significativo.
·
Um ensino, capaz de
respeitar o tempo de aprendizagem, as experiências e os conhecimentos já
construídos pela criança, compreendendo o erro como parte do processo de
aprendizagem.
·
Identificação de
momentos conceituais de compreensão e produção da escrita: pré-silábico,
silábico, silábico-alfabético e alfabético.
·
Escrita espontânea
como oportunidade de produção significativa para a reflexão linguística e para
a constituição da autoria (o aprendiz-autor).
·
Interlocução como
recurso para a troca de informações e desestabilização das hipóteses
construídas, favorecendo a possibilidade de avanço.
·
Escrita do nome
próprio como conhecimento significativo que pode funcionar como referencial
estável de escrita na tentativa de outras produções ou reflexão sobre a língua.
·
Para aproximar a
língua de seus usos sociais, estímulo ao uso de vários portadores de textos, em
diferentes possibilidades de uso, funções ou gêneros de escrita.
·
Reflexão sobre a
escrita para o avanço na compreensão do funcionamento desse sistema
linguístico.
·
Tendências equivocadas da transposição pedagógica
·
Ausência de
intervenções para não atrapalhar o processo individual de aprendizagem, isto é,
sem a preocupação de propor experiências ou situações favoráveis à construção
do conhecimento.
·
Prática pedagógica
como ativismo didático de duração imprevisível, não necessariamente colocando a
criança como foco da intervenção didática.
·
Desconsideração do
planejamento. Aceitação de qualquer tipo de erro sem o esforço interpretativo
para compreender a sua “lógica” ou para transformá-lo em um recurso para a
superação das dificuldades.
·
Divisão da classe ou
de subgrupos de trabalhos “por níveis”.
Planejamento e “proposição de atividades por níveis”. Pretensão de hierarquizar
a aprendizagem em “etapas”, induzindo a progressão do conhecimento a partir da
sucessão dos “níveis” descritos. Avaliação da aprendizagem unicamente com base
nos níveis em tentativas de “classificar” as crianças e seus saberes sobre a escrita.
·
Deixar a criança
escrever livremente, sem interferências e por tempo indeterminado e sem
propósitos ou destinatários definidos. Evitar a correção ou qualquer forma de
revisão textual.
·
Promoção de
trabalhos em grupo, supondo a interlocução como consequência necessária do
“grupamento de pessoas”.
·
Ensino do nome
próprio como a primeira lição do ano e pré-requisito para as demais
aprendizagens.
·
Composição de livros
didáticos que, pretendendo substituir as cartilhas, agrupam diferentes tipos
textuais, mas não asseguram as especificidades do portador nem as reais
situações de uso.
·
Trabalhar só com
textos em detrimento de uma reflexão mais sistemática sobre o funcionamento do
sistema de escrita.
·
Trabalhar com textos
só depois de dominada a escrita alfabética.
Os itens anteriores
demonstram muitas práticas pedagógicas equivocadas que ocorreram após as
pesquisas de Emília Ferreiro sobre a construção da leitura e da escrita na
lógica do pensamento infantil. Ansiosos por encontrar alternativas para os
dramáticos índices de reprovação e fracasso escolar, muitos professores
acabaram fazendo uma transposição demasiadamente direta das situações de
pesquisa, trazendo-a para a escola mais como uma metodologia de trabalho do que
propriamente como um estímulo à reflexão, ao estudo e ao planejamento de
práticas mais compromissadas com o aprendiz. Neste caso, alguns orientadores
pedagógicos proibiam a correção da escrita, dizendo que atrapalharia o processo
individual da criança, além de exigir que os professores esquecessem toda a sua
prática anterior, à qual eles consideravam tradicionais, ao invés de partir
desta prática segura e oferecer-lhe embasamento teórico para criar o novo aos
poucos a partir desses estudos.
Surgiram os modismos
pedagógicos, práticas inconsequentes e até irresponsáveis, embora não
necessariamente mal intencionadas. Muitos professores pressionados por esse
modismo desaprenderam o que sabiam, pois, muitos orientadores diziam que no
construtivismo não existia método. E tudo o que professor fazia de antigo era
veementemente criticado, deixando-o completamente desorientado, pois ao mesmo
tempo a orientadora pedagógica não
oferecia nenhuma orientação em relação à didática de ensino, dizendo que o
professor teria que refletir sobre a escrita da criança para depois intervir.
Intervir ou não
intervir no processo de aprendizagem? Focar somente na reflexão do aprendizado
infantil ou também na metodologia de ensino? Essas eram as muitas questões que
alguns professores faziam e ainda fazem.
O que prevaleceu nos
anos 80 e 90 foi à existência de uma grande parcela de alunos que passaram anos
sem saber escrever alfabeticamente, ou daqueles que, mesmo tendo atingido esse
estágio, não se constituem efetivos usuários da leitura e da escrita.
O construtivismo e não os
erros cometidos nas salas de aula por quem mal o interpretou, é considerado o
vilão dos quadros de analfabetismo na América Latina.
2.2 Os Níveis Estruturais da
Linguagem Escrita Pesquisados por Emília Ferreiro
Ao pesquisar como a criança reconstrói o sistema de escrita, ao se
apropriar dessa linguagem, Emília Ferreiro observou quatro níveis de hipóteses:
pré-silábico, silábico, silábico-alfabético e alfabético.
A orientação para se realizar o diagnóstico de
escrita, é que se escreva quatro palavras do mesmo capo semântico ( animais,
frutas...) e uma frase, às quais sejam nesta ordem: uma polissílaba, uma trissílaba, uma dissílaba e
uma monossílaba e uma frase relacionada a uma das palavras, no entanto não
realizei assim devido a grande demora
para as crianças escreverem e serem vinte e seis alunos na turma.
Demoram umas duas semanas para realizar com a turma toda. São formados grupos de atividades
diversificas (desenho, massinha, mesa, jogos, livros, mesa de atividade
escolar...). Chamo seis crianças na mesa de atividade escolar, primeiro
desenham e depois chamo individualmente para escrever. Inicio com o tema sobre
a “Identidade” e o “Corpo”, por isso as
palavras são relacionadas a esses temas. No início do ano peço primeiro para
desenharem o que gostam e não gostam e depois para deixá-las bem a vontade peço
para escreverem do seu jeitinho, que não tem problema se não sabem, pois quero saber o que já sabem
sobre a escrita para ensiná-las. Então elas escrevem a vontade.
Depois das crianças escreverem é necessário pedir
que leiam. No nível pré-silábico, elas passam o dedo direto na palavra, no
nível silábico elas leem, de acordo com o número de sílabas. Se a palavra tem
três sílabas, a criança irá ler colocando o dedo na letra que corresponde a
cada sílaba. Ás vezes ela pode colocar quatro letras, porém na hora de ler ela
irá ler até a terceira letra, pois a palavra tem três sílabas.
Serão
demonstradas atividades dos portfólios das crianças, às quais demonstram
intervenções e atividades pedagógicas que atuem na zona de desenvolvimento
proximal dos alunos, isto é de acordo com as hipóteses de escrita que estes
apresentam em determinado momento do processo de leitura e escrita. A
professora problematiza com os alunos desequilibrando a lógica do pensamento
destes, possibilitando assim, que a criança reflita e reformule suas hipóteses
iniciais e avance em seu processo de aquisição da escrita alfabética.
·
Nível pré-silábico
A hipótese
pré-silábica se subdivide em duas hipóteses: pré-silábica I e pré- silábica II.
·
Características:
·
Pré-silábico I: é uma fase em que a criança ainda não diferencia desenho e escrita.
Para ela o desenho é uma forma de escrita (fase icônica). Algumas crianças estão na fase das garatujas (rabiscos) e
desenhos circulares, porém a criança sabe exatamente o que quer significa seu
rabisco ou desenho circular, como por exemplo: um círculo pequeno
é ela mesma e um círculo grande, a mamãe. Outras apresentam desenhos mais
definidos, como: casa, sol, carro...
Também imitam a escrita, desenhando ondinhas (letra cursiva) ou
tracinhos (letra de forma) ou pseudo-letras (símbolos que parecem com letras).
Elas observam atos de leitura e escrita e imitam esses atos, tentando grafar as
letras.
·
Na hipótese desses alunos, somente se lê
figuras, imagens e fotos, impossível se ler com letras.
·
Ex: o desenho do Pikachu
representando o nome do desenho. ( Figura 2.1)
Imitação da escrita com ondinhas ( Figura 2.2)
·
Pré- silábico II: neste nível já utilizam letras para escrever palavras, porém a criança
não relaciona grafia à pronúncia (grafema\fonema) e escrevem quantas letras
acharem necessário.
·
Apresentam realismo nominal (quanto
maior o objeto, maior o número de caracteres). Ex: a formiga é pequena, então
tem poucas letras, a baleia é grande, então tem muitas letras.
·
Apresentam a hipótese que uma
palavra tem que ter no mínimo três letras, pois palavras com duas ou uma letra
não é palavra e não pode ser lida.
·
Muitas usam as letras do seu nome e
mudam apenas a ordem, pois em sua hipótese palavras diferentes não podem ser
iguais.
·
Escrevem números e letras, pois não
distinguem suas funções, que um texto é escrito com letras e os números servem
para contar e outras funções, por exemplo.
·
Exemplo: começando a escrever o seu
próprio nome: Roberta, escrevendo as letras do seu nome de forma espaçada em
todo o espaço da folha. As letras se misturam com ondinhas e traços, uma
imitação da escrita ( no nível pré-silábico 1). Seria uma transição entre o
níveis pré –silábicos 1 e 2. ( Figura
2.3)
Exemplo do nível pré-silábico 2: já sabendo que tem
que usar letras para escrever. AQDPAM= DESENHAR. (Figura 2.4)
·
Nível silábico
·
Características:
·
Percebe a
relação entre a oralidade e a escrita (a pauta sonora, de que cada vez que se
abre a boca sai uma sílaba).
·
Usa uma letra para cada sílaba.
·
Pode ou não fazer uso do valor sonoro (
vogal ou consoante).
·
Determina o mínimo de três letras para
ser considerada uma palavra. Em sua hipótese, é impossível escrever e ler
palavras com duas ou uma letra.
·
Exemplo: DEGM= TELEVISÃO ( silábico sem
valor sonoro). (Figura2. 5)
KBA= CABEÇA (silábico
com valor sonoro) ( Figura 2.6)
P.S: Muitas vezes ocorrem conflitos de passagens entre um nível e o
outro, como um conflito de passagem
entre os níveis pré-silábico e silábico, pois é intrínseco ao processo de
ensino-aprendizagem que ocorram conflitos que desequilibram as hipóteses
formuladas, ocorrendo avanços e recuos.
·
Nível silábico-alfabético
·
Características
·
Conflito de passagem entre os níveis
silábicos e alfabéticos.
·
Ora compõe sílabas, ora não compõe na
mesma palavra.
·
Faz maior uso de consoantes Acreditam que algumas consoantes se bastam para a composição da sílaba.
Ex: B= BE
Ex: PEA= PERNA (Figura 2.7)
·
A hipótese silábico-alfabética não é um nível definido, mas um conflito
de passagem entre níveis.
A
hipótese silábico-alfabética é na realidade um conflito de passagem, pois este
nível não encerra atributos de uma estrutura e portanto não é um nível
psicogenético(Grossi, 1990, p.53). Na realidade a criança já está no nível
alfabético de escrita, no entanto há crianças que estão em meio há um processo,
estão em conflito psicogenético e ora escrevem na hipótese silábica,
utiliza uma letra para cada sílaba, ora, escrevem alfabeticamente, relacionando
grafema/fonema, escrevendo a sílaba na forma convencional, pois o processo de
aquisição da escrita alfabética, é um processo em que há avanços e recuos e,
portanto conflitos que não devem ser delimitados com um nível ou estágio.
Algumas, já estão praticamente alfabéticas, mas às
vezes escrevem algumas sílabas no nível silábico, porém, quando mediamos
perguntando que vogal ou consoante falta na palavra, a resposta vem muito
rápida, pois estas crianças já leem. A maioria das crianças que estão nessa hipótese
não lê ainda e confundem o som de várias letras. Precisamos intervir em suas hipóteses
para que elas leiam.
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Nível alfabético
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Características:
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A hipótese alfabética parece ser um fim de um longo
trabalho, mas é o começo de mais uma longa fase.
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Escreve compondo sílabas foneticamente corretas;
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Desconsideram a segmentação entre palavras;
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Hipercorreção: exagera no uso de acentos e
pontuação.
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Ex: PEDIO = PRÉDIO \ A CASA
DO INDIO É
A OCA. (Figura 2.8)
Exemplo de atividades diagnósticas que avaliam os níveis de escrita:
FIGURA 2.1. Exemplo de escrita no nível pré-silábico 1 .
O desenho do Pikachu representando a palavra “Pikachu” e o desenho
do Dragon Ball representando também a escrita. O desenho ainda é uma forma de
escrita ( fase icônica). João Pedro ( 6 anos).
FIGURA 2.2. Exemplo de escrita no
nível pré-silábico 1 . Roberta (4 anos).
Imitação da escrita na forma de ondinhas.
FIGURA 2.4. Exemplo de escrita no nível pré-silábico 2. Analice (6 anos), 26\02\2019.
FIGURA 2.5. Exemplo de escrita no nível silábico sem valor sonoro. Luiza
( 6 anos), 06\02\2019. É considerado como a criança lê. No caso apesar de Luiza
ter escrito uma letra a mais em algumas palavras. Leu de acordo com o nº de
sílabas. Se televisão tem quatro sílabas, ela leu até a quarta letra.
FIGURA 2.6. Exemplo de escrita no nível silábico com valor sonoro. Enzo
Ricardo
(6 anos), 23\03\2019.
FIGURA 2.7. Exemplo de escrita no nível
silábico-alfabético. Isabella ( 6 anos), 11\04\2019.
FIGURA 2.8. Exemplo
de escrita no nível alfabético. Felipe Gabriel ( 6 anos), 22\05\2019.
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